Nevoeiro
O kigo primeiro se apresenta ao poeta, antes de ir para o poema.
Ele é termo, palavra, item de uma estação muito depois de ser um
fenômeno ou ser natural, objeto ou atividade humana sazonal.
No final do outono um dos fenômenos atmosféricos mais tocantes
é o nevoeiro. Na minha cidade, Curitiba, ele adquire aspectos que
vão da delicada beleza à formação de cenários dramáticos.
Ocorre-me que essas variações seguem as observações que deram
origem aos termos sinonímicos: bruma, neblina, nevoaça, cerração.
O haicaísta aprende a observar a natureza e ver sutilezas, nuanças.
O haicai é, também, a arte de notar detalhes.
Aprendi com os trovadores a importância do tema. Pois os mestres
do haicai sabem que uma função secundária do kigo é a de ser um
tema. Bem mais ao gosto ocidental.
-
os ruídos da rua –
do meio do nevoeiro
a mulher de salto
-
josé marins
do meio do nevoeiro
a mulher de salto
-
josé marins
Pequeno estudo –josé marins
deixo-me sonhar –
na falenópsis florida
brancas borboletas
na falenópsis florida
brancas borboletas
- o ponto deste haicai são as flores da orquídea falenópsis;
- falenopse é um kigo de outono, pois essa orquídea, como muitas outras,
floresce nesta estação;
- o sonhar indica que o poeta está diante de uma cena de sonho, uma
metonímia para referir-se ao encantamento diante das flores? ele imagina...
- então, as borboletas não existem? estamos diante de uma metáfora?
- ocorre que o nome falenópsis, cuja denominação científica é Phalaenopsis
amabilis, vem de falenas, um gênero de borboletas; logo, o poeta quis
relembrar esse fato;
- portanto, descaracteriza borboletas como metáfora, o termo passa a remeter
à origem do nome, que na verdade se dá porque as flores brancas dessa
orquídea lembram borboletas, ou
se parecem com elas. (A metáfora estaria na própria origem do nome, mas isto
é outra história).
- e o adjetivo florida, não é uma redundância? Talvez seja. Pensei em
escrever “na orquídea falenópsis”, aí sim uma redundância explicativa, uma
vez que não temos falenópsis que não seja(m) orquídea(s). Poderia escrever
“nas flores da falenópsis”, e estaria retirando do kigo justamente o seu
significado especial, ser uma orquídea que floresce no outono; e, mais, o
terceiro verso, “brancas borboletas”, remeteria sem dúvida a uma metáfora,
pois não haveria como o leitor não fazer a leitura de borboletas reais
naquelas flores;
- tento aqui, também, escapar do duplo kigo, uma vez que falenópsis é kigo
de outono e borboleta, kigo de primavera. No caso desse haicai até seria
admissível a presença deste segundo kigo, uma vez que o principal, que está
no foco do poema, é a orquídea.
Haikai-L] Sereno II compartilhando
SERENO II – josé marins
manhã no jardim –
cai na terra ou volta ao céu
o orvalho das folhas
Os três termos, sinônimos, orvalho, rocio e sereno, são belos.
Fazem parte da poética brasileira, no poema e na letra de música.
Fato que não importa ao haicai, ele não busca a beleza da linguagem.
A natureza não é bela nem feia. A observação do poeta haicaísta não
carece desses conceitos.
É um poeta que coleciona breves revelações.
O poema haicai, que para alguns parece figurativo, é apenas sugestão
do que vivenciou o poeta. As leituras são recuperações do leitor.
(Arrisco-me a dizer que a leitura de um haicai é um desafio à teoria
da recepção, mas isto é outra história).
O que me interessa, nesse momento como haicaísta, é compreender
o kigo não apenas como um termo utilizado no haicai para representar
um fato sazonal. Busco ver os kigo como nomes dados aos seres da
natureza, assumidos pelo haicaísta na leitura das estações, que se inserem
na cultura do povo.
Um apuro da kigologia de Goga & Oda está nos verbetes. Estes auxiliam o
poeta como um dado da técnica haicaística. Penso, por exemplo, que ninguém
precisa fazer um curso de observação de pássaros, mas deve se interessar por
observá-los com cuidado. Biólogos registraram em livro 315 aves que vivem no
perímetro urbano da cidade de Curitiba. Conheço bem quinze delas. Convivo
com elas no meu quintal, no em torno da minha casa, no meu bairro.
Não aceito o papo dos que dizem não haver mais natureza nas cidades. Pude
ver, observar, quatro beija-flores diferentes e raros, durante os dias
que passei em um hotel na rua Marquês de Itu, no centro de São Paulo. Eles visitavam um jardinete cuidado por um funcionário do hotel.
Antes eu era um caçador de haicais, andava com uma lista de kigos no bolso. Ou me dizia, agora é época de florescerem as paineiras, fique atento. Foi
o tempo que dediquei ao haicai que fez dele um poema importante para mim. Hoje, sei, o haicai depende do alcance de meus recursos. Uma coisa me anima: o aprendizado, essa educação pelo haicai, que torna o poeta integrado à natureza, uma espécie de poeta naturalista.
-Fazem parte da poética brasileira, no poema e na letra de música.
Fato que não importa ao haicai, ele não busca a beleza da linguagem.
A natureza não é bela nem feia. A observação do poeta haicaísta não
carece desses conceitos.
É um poeta que coleciona breves revelações.
O poema haicai, que para alguns parece figurativo, é apenas sugestão
do que vivenciou o poeta. As leituras são recuperações do leitor.
(Arrisco-me a dizer que a leitura de um haicai é um desafio à teoria
da recepção, mas isto é outra história).
O que me interessa, nesse momento como haicaísta, é compreender
o kigo não apenas como um termo utilizado no haicai para representar
um fato sazonal. Busco ver os kigo como nomes dados aos seres da
natureza, assumidos pelo haicaísta na leitura das estações, que se inserem
na cultura do povo.
Um apuro da kigologia de Goga & Oda está nos verbetes. Estes auxiliam o
poeta como um dado da técnica haicaística. Penso, por exemplo, que ninguém
precisa fazer um curso de observação de pássaros, mas deve se interessar por
observá-los com cuidado. Biólogos registraram em livro 315 aves que vivem no
perímetro urbano da cidade de Curitiba. Conheço bem quinze delas. Convivo
com elas no meu quintal, no em torno da minha casa, no meu bairro.
Não aceito o papo dos que dizem não haver mais natureza nas cidades. Pude
ver, observar, quatro beija-flores diferentes e raros, durante os dias
que passei em um hotel na rua Marquês de Itu, no centro de São Paulo. Eles visitavam um jardinete cuidado por um funcionário do hotel.
Antes eu era um caçador de haicais, andava com uma lista de kigos no bolso. Ou me dizia, agora é época de florescerem as paineiras, fique atento. Foi
o tempo que dediquei ao haicai que fez dele um poema importante para mim. Hoje, sei, o haicai depende do alcance de meus recursos. Uma coisa me anima: o aprendizado, essa educação pelo haicai, que torna o poeta integrado à natureza, uma espécie de poeta naturalista.
manhã no jardim –
cai na terra ou volta ao céu
o orvalho das folhas
-
josé marins
Fonte:
Grupo Yahoo
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Para:
haikai-l@yahoogrupos.com.br
Um comentário:
O comentário:josé marins
Dizem que o poeta é um ser solitário, isto é meia verdade. Preciso da
solidão para criar,
a outra metade é território dos amigos, estes
que abrem seus corações para o poeta não
morrer de frio.
Adeir é um fulgor perene.
Um abraço afetuoso, josé marins
http://fieiradehaicais.blogspot.com/
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