Além do artista pernambucano Tunga,
que ganha pavilhão de 3 mil m²,
o Inhotim apresenta novas galerias e obras de arte.
Li-Sol-30
Um arquipélago porque cada boa obra engendra uma ilha, com topografia, atmosfera e vegetação particulares, eventualmente semelhante a outra ilha, mas sem confundir-se com ela. Percorrê-la com cuidado equivale a vivenciá-la, perceber o que só ela oferece.
"Folha Explica - Arte Brasileira Hoje"
Autor : Agnaldo Farias
Editora: Publifolha
Páginas : 128
Quanto : R$ 18,90
Onde comprar : nas principais livrarias,
pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Publifolha -
27/09/2008 - 07h22
Entenda a arte contemporânea brasileira,
de Lygia Pape a Leda Catunda;
leia capítulo exclusivo
O livro "Arte Brasileira Hoje", volume da coleção "Folha Explica", da "Publifolha", traça o perfil de 26 artistas contemporâneos brasileiros e explica tudo o que você precisa saber para entender pinturas, esculturas, desenhos e gravuras contemporâneas.
Livro traça o perfil de 26 artistas contemporâneos brasileiros |
Assinada por Agnaldo Farias, professor do curso de Arquitetura e
Urbanismo da Escola de Engenharia de São Carlos (USP), a obra lida com o
tema em diversas frentes profissionais. Destacam-se os textos que aliam
a objetividade histórica à análise técnica de obras, tais como aqueles
sobre Leda Catunda, Carmela Gross, Ivens Machado e Lygia Pape.
Além de lecionar no curso de arquitetura e urbanismo, Farias foi também
curador da representação brasileira na 25ª Bienal de São Paulo.
Como o nome indica, a série "Folha Explica"
ambiciona explicar os assuntos tratados e fazê-lo em um contexto
brasileiro: cada livro oferece ao leitor condições não só para que fique
bem informado, mas para que possa refletir sobre o tema, de uma
perspectiva atual e consciente das circunstâncias do país.
O primeiro capítulo pode ser lido abaixo.
*
Pequeno guia para os perplexos
Este livro, exclusivamente dedicado a um mapeamento da arte
contemporânea brasileira, destina-se àqueles que ficam perplexos com
muito daquilo que hoje se faz em nome da arte. Por exemplo: aqueles que,
dotados de boa vontade, disposição física e sapatos confortáveis, se
põem a peregrinar pelos vastos espaços onde acontece a Bienal de São
Paulo e lá submergem em meio às instalações, performances, vídeos, obras
de fatura conceitual, trabalhos que no geral lhes soam
incompreensíveis, inescrutáveis; sucumbem, sobretudo, aqueles que para
lá se encaminham tendo em mente que arte é coisa que acontece na forma
de pinturas, esculturas, desenhos e gravuras.
O livro é especialmente dedicado àqueles que trocam o que pode haver de
estimulante na inquietude e no desconcerto proveniente da incompreensão
de algo pela sensação de estarem sendo enganados ou mesmo insultados por
ele. A esses a lembrança de que não se deve cobrar transparência de um
livro escrito em língua que se desconhece ou não se domina. Por que
então cobrar isso da arte, se arte é expressão em toda a sua potência -
além da forma e significado da expressão que se emprega cotidianamente,
além da realidade que nos é ofertada a cada dia, cujos limites se fecham
antes de até onde pode ir a imaginação?
PARA COMEÇO DE CONVERSA, UMA OBRA DE TUNGA
A fotografia traz o artista sobre uma rocha fustigada pelo mar. De
costas para nós, de frente para a água, ele está descalço sobre o chão
de pedra corroído, com a barra da calça e as mangas da camisa enroladas,
com o corpo retesado e o braço esquerdo deslocado de modo a compensar o
esforço que o outro braço está fazendo: sobre sua cabeça, tomando o
próprio corpo como eixo, ele gira vigorosamente outra cabeça; uma cabeça
cujos longos cabelos ele está agarrando pelas pontas, aparentemente
para lançá-la mar adentro o mais longe possível. A cabeça que ele está
girando é a sua própria. De acordo com a seqüência de fotos e com o
texto que as acompanha --fotos e texto que, juntos, compõem o trabalho
Semeando Sereias, de 1987--,1 ele encontrou a cabeça quando esta boiava
numa poça de água criada por uma cavidade na rocha. O texto confirma o
arremesso da cabeça ao mar. E descreve como ela ficou batendo nas pedras
por causa dos cabelos emaranhados em sargaços e mariscos; e como o
narrador tentou desembaraçá-la e, empenhado nisso, esbarrou em novas
surpresas.
O nome do autor desse trabalho é Tunga. Ele, assim como vários de seus
colegas brasileiros, passa grande parte do ano viajando, realizando
exposições aqui e lá fora, alvo de ensaios, de críticas e até de
chilreantes crônicas sociais, numa rotina que contrasta com os tempos
heróicos, de há bem pouco, quando ser artista plástico no Brasil era
invariavelmente empresa árdua, de reconhecimento e rendimento quase
nulos, sem o direito trivial de uma conta em banco (que para isso era
necessário renda regular), no geral com a vida somente aplainada pela
ventura de um bom berço ou por colocar seu talento a serviço da
ornamentação das casas burguesas ou mesmo do poder estabelecido. Não que
hoje seja um mar de rosas, mas qualquer grande exposição internacional,
e os curadores em sua peregrinação pelo mundo à cata de valores, já
incorporou a arte brasileira e o Brasil como parada obrigatória. E,
quando a imprensa periódica cuida em divulgar os altissonantes valores
das Bienais de São Paulo (entre outras mostras temporárias), vê-se logo
que pensar em arte hoje significa pensar num negócio rentável, seja do
ponto de vista do capital financeiro, seja do ponto de vista do capital
simbólico.
Embora tratada como um produto em alta crescente no meio internacional,
em nosso país a arte contemporânea brasileira é ainda vista com reservas
por um público forquilhado entre a curiosidade e a irritação causada
pela dificuldade em compreendê-la.
Semeando Sereias é um exemplo suficientemente intrigante: o que dizer do
artista que arremessa sua cabeça ao mar? Em vez do cotidiano
contabilizado e confortável, do comércio habitual de mercadorias,
atitudes e pequenos sonhos, o espaço em que o artista age fica na
fronteira que separa do chão firme, ainda que dilacerado, o mar, a parte
móvel do mundo, ilimitada e insondável. Lugar de onde ele volta
portando objetos, imagens, textos, à primeira vista incompreensíveis.
Com sua pletora de significados, a imagem retirada de Semeando Sereias
alinha-se com a experimentação realizada sobre a mistura de narrativas e
materiais diversos que move a arte que se produz hoje. E, nesse
sentido, a trajetória de Tunga é exemplar - razão pela qual ele é o
primeiro artista a ser apresentado neste livro.
Desde o início, no começo dos anos 70, Tunga vem promovendo o "contágio
mútuo" (o termo é dele) de coisas díspares. Ainda que aparentemente
fechadas e irredutíveis, as coisas --entre elas, nós-- podem
comunicar-se umas com as outras; até mesmo metamorfosear-se umas nas
outras, como no vídeo Nervo de Prata (de Arthur Omar, 1987), em cujas
últimas imagens se embaralham um túnel e um sapo que vai sendo devorado
por uma serpente. O olho do espectador, por sua vez devorador de
imagens, engole um túnel contínuo e posteriormente assiste à engolição
de um animal pelo outro.
São inúmeros os materiais de que o artista faz uso, e imenso o recurso a
todas as expressões artísticas, da literatura à música e até às
disciplinas científicas. Para Tunga, tudo vale, tudo interessa. Desde a
matéria mais opaca e densa até aquela intangível --como o charuto e sua
fumaça (Barroco de Lírios, 1995), a qual, segundo o artista, é parte
indissociável do objeto, num caso em que a continuação da matéria
acontece em volutas de ar.
É freqüente que um trabalho de Tunga solicite que se saiba como ele se
relaciona com suas outras obras. Nem pintura, nem escultura, nem nenhuma
das modalidades expressivas convencionais --onde, enfim, encaixar esse
trabalho de Tunga e os à primeira vista inclassificáveis trabalhos de
Waltercio Caldas, Artur Barrio e José Resende, entre tantos outros de
que este livro irá tratar, trabalhos com os quais deparamos em galerias,
museus e bienais dedicados à arte contemporânea?
ARTE CONTEMPORÂNEA - NOTAS SOBRE UMA NOÇÃO
Primeiro foi o futurismo, e hoje o senso comum identifica "moderno" como
sinônimo do que há de mais novo, o mais atual ou mais contemporâneo.
Mas, no que se refere a arte, moderno é uma coisa, e contemporâneo,
outra. Moderno é o nome de um movimento com características particulares
que nasceu na Europa, com variados desdobramentos por quase todos os
países do Ocidente, e que entrou em crise a partir da década de 1950. A
partir daí, foi sendo substituído por um conjunto de manifestações que,
cada qual dotada de peculiaridades, foram, na falta de um nome melhor,
reunidas sob a etiqueta simples e genérica de arte contemporânea.
Embora escorado no senso comum, quando aplicado à arte o termo
contemporâneo vai além de simplesmente designar o que vem sendo feito
agora. Em primeiro lugar, convém observar que nem tudo que anda sendo
feito no campo da arte é contemporâneo; do mesmo modo, será prudente
alertar que a arte contemporânea não é prerrogativa de gente jovem.
Salvo exceções, os jovens artistas possuem trajetórias de início
irregular, incapazes de propor um conjunto homogêneo de problemas e
enigmas consistentes.
Assim como vamos em direção ao passado movidos por indagações feitas
agora, no presente, faz sentido argumentar que é contemporânea toda e
qualquer manifestação artística que ressoa em nós. De acordo com esse
raciocínio, seria contemporânea tanto uma instalação dos anos 90 do
iconoclasta artista carioca Artur Barrio ou uma obra do compositor e
maestro francês Pierre Boulez, quanto Las Meninas, a célebre pintura de
Diego Velázquez, do século 17, ou uma sinfonia de Mozart, do século 18.
Se o argumento é legítimo, por outro lado encontra lá suas
insuficiências, notadamente no presente caso, quando se pretende
apresentar as novidades ocorridas não tanto no âmbito da recepção por
parte do público, que pode sensibilizar-se com uma pintura rupestre, uma
estatueta grega do século 5 a.C. etc., quanto no da produção artística
propriamente dita. Nesse sentido, é forçoso reconhecer que há um abismo
entre Mozart e Boulez, entre Las Meninas e uma instalação do Barrio --em
particular uma apresentada recentemente em exposição realizada no Paço
das Artes, em São Paulo, com muito pó de café espargido pelo chão,
textos garatujados nas paredes, cheiro de urina e dos peixes ressecados
pelas pilhas de sal grosso.
Cada obra de arte é em si mesma um sinal de descontentamento. Todo
artista, diversamente do comportamento-padrão, em vez de simplesmente
satisfazer-se com as obras já existentes, de ficar extasiado pela
leitura de um livro, pela contemplação de uma pintura ou pela audição de
uma música, prefere ir além: prefere produzir mais um livro ou pintura
ou obra musical. Sintoma de uma insatisfação, cada obra de arte traz
embutida uma crítica à própria noção de arte e pode mesmo modificar
aquilo que entendemos por arte.
Uma vez que o contemporâneo deita suas raízes no período moderno que lhe
é imediatamente anterior, sua definição passa necessariamente pela
definição desse movimento, o que aqui só poderá será feito em termos
simplificados.
Empreendimento temerário, ainda assim
O tema é vasto, e os debates sobre ele seguem caudalosos. Mas, de um
modo geral, situa-se o início da arte moderna em meados do século 19,
com o realismo de Gustave Courbet, anunciado por ele em 1847, e o
impressionismo que o seguiu. A partir daí, a arte paulatinamente se
afastou de seus cânones renascentistas, do compromisso de uma
representação fidedigna do mundo, com as pinturas e esculturas se
ocupando não em fabricar duplos da realidade, mas em afirmar suas
próprias realidades. A bidimensionalidade das primeiras, a concretude de
seus planos e cores seriam sua nova razão de ser, do mesmo modo que a
tridimensionalidade das segundas abandonou a ilustração de temas --o
elogio de um herói, a encenação de uma passagem mítica etc.-- para
encerrar-se numa discussão sobre sua materialidade, sobre o gesto que a
formalizou, as peculiaridades de sua volumetria etc.
O desembocar na abstração foi o corolário desse processo de tematização
de seus próprios elementos constitutivos, com a arte dando as costas
para qualquer relação de ilustração do mundo. Coerente com esse vetor, a
persistência das vanguardas em buscar o novo sublinha o desejo dos
artistas de manter a experiência estética como fim em si mesmo, longe,
como salientou o artista russo Kasimir Malevich em seu Manifesto
Suprematista, de 1913, da clássica subserviência à religião ou ao Estado2.
A arte contemporânea nasce como resposta ao esgotamento desse
ensimesmamento da arte, com as modalidades canônicas --pintura e
escultura-- explorando-se, investigando suas naturezas até o avesso.
Entre os índices - e são tantos! - desse esgotamento, figuram desde o
retorno de questões e fórmulas antes vistas como ultrapassadas --a
pintura e a escultura figurativas, de conteúdo político, mitológico
etc.-- até o florescimento de expressões híbridas, quando não
inteiramente novas, como as obras que oscilavam entre a pintura e a
escultura, os happenings e as performances; as obras que exigiam a
participação do público; as instalações; a arte ambiental etc.
ARTE CONTEMPORÂNEA NO BRASIL
Um livro como este, de dimensões reduzidas e com a intenção de tratar da
arte contemporânea no Brasil, deve proclamar logo de saída seu
inacabamento. Esse fracasso que com algum descaro se anuncia deriva do
fato de a arte contemporânea ser, por definição, algo em processo; algo
que, mesmo na qualidade de desdobramento de influentes genealogias, não
se limita a reproduzi-las com subserviência. Ao contrário, nega-as
expandindo seus limites ou confrontando seus princípios normativos;
assume caminhos e formas que elas não prescreveram ou que o fizeram como
um impedimento.
Tratar da arte contemporânea no Brasil implica tratar de um universo
amplo, embora não tanto quanto o da cena internacional. Fenômeno que se
explica não só pela pouca quantidade de artistas, mas também porque o
estágio atual da produção artística, embora sirva-se de temáticas,
instrumentos e preocupações provenientes de fora, depende em essência do
que já aconteceu por aqui, das sendas abertas pelos artistas que vieram
anteriormente e que transpuseram os modelos da arte européia para nosso
meio, por meio de obras que lograram ressoar na arte produzida
localmente. Não foram tantos --Tarsila do Amaral, Cândido Portinari,
Vítor Brecheret, Lasar Segall, Di Cavalcanti, Alberto Guignard, Oswaldo
Goeldi, Livio Abramo, Iberê Camargo, Sérgio Camargo, Milton Dacosta,
Alfredo Volpi, Lygia Clark, Hélio Oiticica, Mira Schendel a lista, não
tão grande, prossegue-- e até os anos 50 eram como fenômenos isolados,
que diante de um meio artístico ainda por ser construído, com poucas
obras e raros debates de alto nível, tiraram de si mesmos os parâmetros
que balizaram a construção de suas obras. De fato, só a partir da
passagem dos 50 para os 60, com as discussões em volta do expressionismo
abstrato e sobretudo com o abstracionismo geométrico (concretismo e
neoconcretismo), obteve-se a emancipação de nossa inteligência plástica e
constituiu-se um solo que, com o tempo, se mostraria grandemente
fértil.
No Brasil, sob a genérica etiqueta de arte contemporânea, convivem
artistas das mais variadas gerações, responsáveis por obras que vão
desde as de raiz eminentemente moderna até as que rompem com esses
cânones. Ao primeiro caso pertencem obras de artistas cujas trajetórias
tiveram seu ponto de partida nos anos 50 e 60 e que ainda se mantêm
perfilados e lavrando sob os mesmos princípios de então, embora
expandindo-os, demonstrando que arte não confina com moda. Esse é o caso
de Amilcar de Castro, Tomie Ohtake, Franz Weismann, Eduardo Sued,
Gilvan Samico, Arcângelo Ianelli, Franz Krajberg, Flavio Shiró e mais
alguns poucos. Artistas cuja consagração não rima com cristalização,
embora sua raiz moderna sugira que eles não sejam tratados neste livro.
Incluiremos, sim, os artistas que iniciaram suas trajetórias a partir
dos anos 60, a maioria na passagem para os anos 70 e ao longo destes,
quando produzir arte significava operar na expansão do objeto artístico,
seja pela apropriação de coisas e imagens extraídas do cotidiano, seja
por radicalizações cada vez maiores, traduzidas em obras mais complexas
do ponto de vista conceitual, mais interessadas no plano intelectual dos
espectadores do que em suas retinas. Durante esses anos, a arte apostou
numa relação mais próxima com o público, e para isso foi estratégico o
revigoramento do binômio arte-política. A arte estava duplamente
preocupada em efetuar a crítica de um país que se urbanizava
avassaladoramente e em romper o amordaçamento coletivo da expressão
promovido pela ditadura militar, instituída por meio de um golpe em
1964. Foi em nome disso que as obras abertas à manipulação chegaram aos
museus e galerias junto com a busca de lugares alternativos e de outros
materiais e suportes expressivos: um fluxo de novidades que punham em
xeque a natureza e o papel da arte, de seu circuito, do aparato
institucional que a legitimava e a veiculava.
Sob o signo da arte contemporânea, estão também os artistas surgidos nos
anos 80, que ficaram conhecidos pela retomada --ainda que em outra
chave-- das formas tradicionais de expressão, com destaque à pintura, o
que, tanto na forma quanto no conteúdo, era índice de um relacionamento
com o grande inimigo da modernidade: o passado.
Finalmente, estão os artistas da década de 90, encerrada há pouco, cujas
obras em construção confirmam a sensação de uma crise aguda ou mesmo do
fim da arte moderna. Obras que se opõem ao projeto de uma linguagem
universal e da busca metódica da novidade pela ruptura, que irrompem
numa miríade de poéticas originárias das mais diversas matrizes: das que
mergulham em referências históricas e pessoais àquelas que parodiam a
própria arte e o círculo na qual ela está enredada; das que criticam a
idéia de autonomia da arte, preferindo abandonar os suportes
convencionais --pintura, escultura etc.-- em favor de manifestações
híbridas, àquelas que descartam as respeitáveis heranças do
neoconcretismo, buscando outras fontes, do barroco mineiro à arte
popular, do debate sobre o problema da imagem na vida atual à
especulação sobre o corpo e suas pulsões etc.
A ARTE CONTEMPORÂNEA ENTENDIDA COMO ARQUIPÉLAGO
Diversamente do período moderno, com suas correntes e tendências
artísticas organizadas em grupos como as vanguardas construtivas, os
futuristas, dadaístas, surrealistas e outros, autores de manifestos,
fundadores de revistas e até escolas, a arte contemporânea no Brasil,
como já foi dito, embora possuindo suas matrizes, avança num número tal
de direções e é constituída por obras tão singulares que, tudo
considerado, ela sugere um arquipélago. A imagem é boa porque foge do
reducionismo das grandes etiquetas, que, ao valorizarem as semelhanças
entre as obras de alguns artistas, não atentam convenientemente para as
diferenças entre elas. Outros argumentos a favor dessa imagem: em
primeiro lugar, a descontinuidade que ela sugere, o que contraria a
idéia de que seu desenvolvimento se dá linearmente, com cada obra se
apresentando como um desdobramento da anterior; e, em segundo lugar,
porque com ela nos afastamos da pretensão de um levantamento total de
nosso problema, inviável pela extensão que ele assumiria, incompatível
com a proposta deste livro.
Um arquipélago porque cada boa obra engendra uma ilha, com topografia, atmosfera e vegetação particulares, eventualmente semelhante a outra ilha, mas sem confundir-se com ela. Percorrê-la com cuidado equivale a vivenciá-la, perceber o que só ela oferece.
Para melhor levar adiante esse princípio de valorização da obra, o mais
adequado será apresentar ao leitor análises de um ou mais trabalhos
realizados por cada um dos artistas aqui apresentados. As obras serão
comentadas por ordem alfabética de autor. Procedendo desse modo, renovo a
lição do poeta Mário Quintana, que, quando indagado sobre o que se
deveria ler para compreender Shakespeare, bradou incontinenti:
Shakespeare!
Por último, o leitor deverá considerar que este livro corresponde apenas
a um mapeamento. Cabe alertá-lo para o fato de que o arquipélago
formado por nossa produção é tão rico que seria fácil mapeá-lo a partir
de outras obras.
1 -Tunga, Tunga - Barroco de Lírios. São Paulo: Cosac & Naify, 1997.
2 - Em H.B. Chipp, Teorias da Arte Moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
2 - Em H.B. Chipp, Teorias da Arte Moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
"Folha Explica - Arte Brasileira Hoje"
Autor : Agnaldo Farias
Editora: Publifolha
Páginas : 128
Quanto : R$ 18,90
Onde comprar : nas principais livrarias,
pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Publifolha -
27/09/2008 - 07h22
Li-Sol-30
Fonte:
27/09/2008
-
07h22
Revista Encontro
Publicado em 17/09/2012
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