sábado, 30 de abril de 2011

FRIDA KAHLO - ARTE E SOFRIMENTO

O diário de Frida Kahlo

Marcelo Bessa

A intérprete do sofrimento


Frida Kahlo, cerca de 1939
 
A primeira vez que li algo a respeito da pintora Frida Kahlo foi numa reportagem de um jornal brasileiro no fim da década de 80. Apesar de ser então pouco conhecida no Brasil - e aquela reportagem tinha justamente a função de apresentá-la a um público maior -, Frida, já na década anterior, havia finalmente ultrapassado as fronteiras do México, sua terra natal, e os círculos de especialistas em artes plásticas. 

Sua póstuma popularidade pode ser creditada, em parte, graças aos imigrantes mexicanos nos Estados Unidos, aos espaços dedicados às análises das margens do cânon e aos estudos feministas, que se ampliavam, também na década de 70, nos espaços acadêmico e cultural americanos. Assim, Frida - nascida em 1907 na Cidade do México, onde faleceu em 1954 - começou, na década de 80, a tornar-se "pop". 

Até Hollywood se rendeu a ela, em 2002, com o filme Frida, dirigido por Julie Taymor e estrelado por Salma Hayek (no entanto, em 1984, o diretor Paul Leduc já havia feito um filme sobre a pintora, intitulado Frida: naturalesa viva, estrelado pela atriz Ofélia Medina, cuja atuação é considerada excelente). 

Assim, sua vida e sua obra tornaram-se,
décadas após sua morte, parte do domínio público.

Em Frida Kahlo, vida e obra têm como leitmotiv o sofrimento. Lembro-me até hoje do mal-estar que senti ao ler a reportagem. Pareceu-me inacreditável que alguém pudesse sofrer tanto fisicamente. A pólio quando criança, o horrível acidente da adolescência, as dezenas de cirurgia por que passou, a amputação da perna direita, tudo isso era demais para uma pessoa suportar.

A partir desse momento, "sofrimento" e "dor" foram as palavras que vinham à minha mente ao ouvir o nome da pintora. Posteriormente, tive contato com seus quadros e me surpreendi com o que vi.

O seu sofrimento físico estava transmutado 
em várias de suas pungentes telas. 
A dor, geralmente tão difícil de ser descrita
ou retratada, lá estava.

É uma dor que avança o limite espacial da tela 
e alcança o espectador. 

A escritora inglesa Virginia Woolf dizia ser indescritível o sofrimento. Virginia, de certa forma, tem razão: o sofrimento e a dor, quando manipulados, por exemplo, num papel ou numa tela - portanto, fora do espaço físico ou emocional do sujeito-paciente -, tendem a enfraquecer ou mesmo a se tornar lamentos incompreensíveis, distantes ou mesmo insignificantes. 

Como observou o escritor mexicano Carlos Fuentes, isso ocorre porque, além de indescritível, o próprio sofrimento e a própria dor não são divisíveis, não podem ser compartilhados com outra pessoa. Mas há aquelas pessoas que, como Frida, conseguem essa difícil tarefa, o que levou o escritor a afirmar que "Frida Kahlo é um dos maiores intérpretes do sofrimento".
Fonte:
Educação Pública

CEZANNE: A SENSAÇÃO VISUAL

Cézanne: 

A sensação visual ao nível da consciência

Nataraj Trinta
 Mestranda em História Social da Cultura na PUC-Rio

  Cezanne Auto-retrato



Considerado por muitos o pai da pintura moderna 
ou o artista que realizou o impressionismo integral 
 (Argan, 1992, p. 111), 

Cézanne construiu uma linguagem 
que ampliou o horizonte da pesquisa impressionista inicial,
mas também a contrariou em muitos de seus dogmas. 


Os impressionistas acreditavam que a inteligência visual era uma inteligência específica e que o núcleo verdadeiro da impressão visual era o ponto luminoso descontínuo (que origina a técnica do petits touche), em detrimento de forma e contorno. Buscavam a apreensão do instante, negando o tempo metafísico e afirmando sua fugacidade. Ou seja, aquele instante no momento em que ele aparece no tempo e no espaço. Um exemplo disso é a série de retratos, realizada por Monet, da Catedral de Rouen, uma série de 50 imagens pintadas em horários diferentes, entre 1893 e 1894, reproduzindo a incidência da luz sobre a obra. 

O objetivo da pintura não era científico, ou seja, não buscava produzir um conhecimento, mas produzia a emoção visual através de um método de pesquisa. Um verdadeiro estudo da impressão visual na emoção por parte de um pintor que realiza uma obra como um cientista moderno. 



O pintor, portanto, adquiria neste momento uma função social nova: representar, através da investigação, o modo como a retina humana detinha a luz. Garantia-se também à pintura um estatuto de saber livre e recobrava seu valor frente à arte fotográfica.

A tradição pictórica priorizava a forma através do desenho e desdenhava da cor e da luz, tratando-os como atributos secundários. Os pintores modernos, por sua vez, procuravam abolir a tridimensionalidade da forma através da redução da palheta aos tons puros e negligenciando o contorno e o escorço (representação a partir das leis da perspectiva). No entanto, continuavam obedecendo a critérios de projeção da tela de cavalete, apresentavam ponto de fuga e mantinham a tela como uma janela sobre a qual se projetava uma cena (não perspectivada dentro dos modelos tradicionais, mas criada a partir de um olhar definido pela perspectiva renascentista). 

Cézanne também concebeu sua pintura como pesquisa pura e desinteressada, mas aproximava-se mais da figura de um filósofo. Pesquisava a verdade. Mas o que vem a ser a verdade em pintura?



Inconformado com a tradução da impressão visual que excluía a forma, Cézanne ,antes de reproduzir a sensação visual, buscava construir a imagem com materiais da pintura. O que para muitos de seus contemporâneos pareceu um impressionismo tímido com a volta da profundidade, do contorno, do desenho e do escorço à tela, era nada menos que a tentativa de dar conta da multiplicidade do campo visual. 

Já não se preocupava em registrar objetos em um dia X e um momento Y, mas “captar um instante inteiro”, pintar um Poussin vivo – o barroco francês pintado em contato direto com a visualidade, unindo a experiência refletida do passado no flagrante da sensação. 

Para tanto, recusava a simplicidade dos tons puros, instaurava o senso de profundidade não mais gerado pela terceira dimensão, abolia a divisão tradicional entre desenho e cor, assumia a luz pictórica como forma de construção da imagem e extinguia o ponto de fuga de suas telas. Sua composição é densa, os volumes são pesados, a cor é opaca e as formas são decompostas em várias nesgas coloridas. Suas pinceladas possuem razão estrutural, e o espaço passa a ser criado, não sendo mais um dado a priori.


 Cezanne - Banhistas

O pintor representa não mais a realidade como ela é nem como a vemos, mas a realidade na consciência. Trabalha com os conceitos racionalizados da pintura (cilindro, cone, esfera) não para afirmá-los, mas para construir seu tema (que fora predominantemente a natureza morta) e questionar a própria racionalidade da visada pictural. 

Argan declara que Cézanne compreendeu que o impressionismo deveria nascer de um novo classicismo, não mais fundado na imitação dos antigos, mas dedicado a formar uma nova imagem através da consciência. A pintura seria, portanto, não mais uma literatura figurada nem uma técnica capaz de transmitir a sensação visual ao vivo, porém um modo de investigar as estruturas profundas do ser. Um modo de fundir e estabelecer uma identidade entre a experiência (a sensação) e o pensamento. Desse modo, Argan explica o termo impressionismo integral e desvenda como Cézanne amplia a pesquisa impressionista inicial.

Embora tenha introduzido tanta novidade, Cézanne só foi reconhecido próximo à sua morte e seu trabalho só foi verdadeiramente considerado a partir de estilos que viram no pintor um mestre. Sua obra influenciou intensamente Matisse e o cubismo. 




O mestre de Picasso e Braque, diferentemente do que muitos pensam, não afirmou que as aparências naturais deveriam ser reduzidas às formas geométricas, não se referiu a um resultado específico, mas revelou um processo que fora explorado em demasia no início do século XX.
Picasso ressaltou que o maior ensinamento do “processo cézanneano” foi a angústia de um artista responsável pelo seu quadro, responsável por sustentar a realidade do real em pintura. A despeito de sua vida reclusa, o grande mestre enfrentou os problemas sociais de seu tempo – não teorizando, mas sofrendo com a arte e definindo, a partir da verdade em pintura, sua função como artista.

Referências

ARGAN, Giulio Carlo. 
Arte Moderna. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
CHIPP, Herschel Browning. Teorias da Arte Moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
Anotações de aulas de Ronaldo Brito sobre Cézanne em abril de 2008.
Fonte:
Educação Pública
Anotações de aulas de Ronaldo Brito sobre Cézanne em abril de 2008.
Publicado em 15/09/09

sexta-feira, 29 de abril de 2011

TICIANO -TIZIANO VECELLIO - Ceia em Emaús

Ticiano (Tiziano Vecellio), Ceia em Emaús, 1533-34, óleo sobre tela.
Museu do Louvre, Paris, França. Réunion des Musées Nationaux/Art Resource, NY.
“A ceia em Emaús" mostra uma célebre cena bíblica. Após a Ressurreição, Cristo se encontra com dois de seus discípulos que seguiam pelo caminho de Jerusalém para Emaús. Ticiano mostra o momento em que, durante a ceia daquela noite, Jesus revela-se aos discípulos quando parte o pão. A maneira pela qual abençoa a ceia mostra-lhes de súbito que o Mestre está vivo.
Esta cena do Evangelho de Lucas mostra o interesse de Ticiano em texturas: as dobras da toalha de mesa ou de luz refletida por um copo de vinho.
Em baixo da mesa,
um cachorrinho parece estar
querendo brigar com um gato,
contrastando com a paz do ambiente.
Fonte:
ArnaldoPoesia
http://starnews2001.com.br

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Femusc 2011 - Orquestra sem Maestro - Abertura Egmont

Uma orquestra sem maestro só pode realizar com acerto se cada e todos elementos estão na mesma sintonia , conscientes de suas partituras,a dar com fidelidade o seu timbre ,na hora exata, absolutamente adaptado ao conjunto que dele espera e depende da sua excelente parte-participação.O "sábio deve estar acorrentado" ao grupo e dar o melhor de seu próprio instrumento.Isso implica ausência de LIBERDADE,
Nesse vídeo, o Maestro é o Primeiro Violino, "sentado" de frente e comandando sim.Mas valeu!

terça-feira, 26 de abril de 2011

A ARTE DE CLARICE LISPECTOR

Um novo jeito de ler
Clarice Lispector

A escritora também transformava palavras em imagens deixando fluir sua busca infinita nas tintas que se aliavam aos veios da madeira. É a inquietude de escrever com pincel que Ricardo Iannace apresenta no livro Retratos em Clarice Lispector, lançamento da Humanitas, em co-parceria com a Editora da UFMG. Também a Edusp apresenta uma nova edição de Clarice: uma vida que se conta, de Nádia Battella Gotlib
 Núcleo do fogo
na montanha de palavras
- desfia cor e ação .

desfia o fogo
desfila
destila
coração
sacra e profana oração
Ler Clarice Lispector através de suas pinturas. 
É esse o desafio do leitor ao folhear as primeiras páginas de Retratos em Clarice Lispector – Literatura, pintura e fotografia, de Ricardo Iannace, lançado pela Humanitas e Editora da UFMG. São 18 imagens – 17 em madeira de pinho-de-riga e apenas uma em tela –, que estão arquivadas na Fundação Casa de Rui Barbosa.

Cada uma delas tem algo para contar. Ver. Ou esconder.  Foram todas pintadas em 1975. Dois anos antes de morrer. Mas o que levava Clarice a escrever pintando ou pintar escrevendo? É esse questionamento que toca o leitor diante dos quadros e da vida. O mesmo questionamento que levou Iannace a pesquisar durante anos. O resultado foi a tese de doutorado defendida em 2004 na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, que agora pode ser vista em livro.
Tocha ou vaso
no pódio da vida
- gritante vitória.
 A Gruta- detalhe

Como se não bastasse
a mágica das palavras
- Clarice pintava.

Alma de Clarice
a gruta espelha fiel
- Maravilhosa!
 medo - maio ,1975

Desenha o medo
provando ao seu filho:
- papão bonitinho.
 Clarice alegre

No chão reluzente
o riscado da dança
- mapa da alegria.
 Auto-retrato??

Quem registrou
o rosto enigmático
- da bela  Clarice?
Gruta


A mágica circular
de terras,ocres rosados
- arte de mestre
Iannace percebeu o mundo da escritora saltando da madeira.

“São imagens pequenas, feitas em chapas de pinho-de-riga, de espessura fina, que já sofreram uma ligeira alteração”, explica. “Duas delas trazem imagens na frente e no verso e há aquelas que, na ausência de título, apresentam, atrás, apenas a assinatura da autora de atravessado.”
Clarice, na avaliação de Iannace, não tinha a intenção de mostrar a sua face de pintora. Seus quadros não traziam nenhuma perfuração, gancho, nem foram feitos para serem emoldurados.

“A impressão é que ela pintava como um exercício, 
sem nenhuma pretensão.”

Só impressão.
- ela se transmutava
no turbilhão de cores.
 Clarice - A gruta- detalhe

Rompe da escuridão
o olhar camuflado
entre a folhagem.
 A professora da FFLCH Nádia Battella Gotlib, que há anos estuda e pesquisa a trajetória de Clarice Lispector, observa as suas pinturas como um mero passatempo.

“Uma tendência para deslocar-se cada vez mais do figurativo, na escrita, aproximando-se do ritmo e de sons puros, desvinculados de compromissos com a linha contínua do discursivo e da história; e na pintura, detendo-se em cores e linhas, com manchas fortes. E construção que indicia inquietação e turbulência interior.”

Só recentemente a crítica vem se atendo
à pintura de Clarice Lispector. 

Clarice- A gruta- detalhe 

Basta este detalhe
de incrível beleza
- Clarice imortal !
Luta e paz

No palco azul
veste esbranquiçada
- respingos gritantes.
Mas, exatamente para evitar que esses quadros tenham a análise rigorosa de uma obra de arte, o trabalho de Ricardo Iannace traz uma nova dimensão do trabalho da escritora. E propõe uma análise inusitada no contexto da literatura e também da pintura e da fotografia.  Ou, como define Nádia Gotlib, que assina a apresentação do livro Retratos em Clarice Lispector, é um novo jeito de ler e apreciar o legado da escritora.

“A leitura da arte abstrata em Clarice e a partir de Clarice, 

Iannace faz promovendo um diálogo produtivo com teóricos e críticos como Giulio Carlo Argan, Mel Goodin e Charles Harrison”, explica a professora.

“O repertório atento ao movimento do próprio processo de linguagem artística, desvinculado de compromissos figurativos, desenvolve a discussão sobre a forma do retrato a partir da leitura de textos que a própria Clarice traduziu e adaptou.”

A capa do livro de Iannace traz um retrato inédito de Clarice Lispector: um desenho pintado pelo poeta mineiro Otávio Dias Leite em abril de 1947.
Luta e paz

O rosto azul
da noiva do tempo
-  esvoaça o véu carmim .
Linhas e linhas – Iannace vai buscando a admiração e a identificação de Clarice com a pintura. Em A descoberta do mundo, Clarice registrou:

“A verdade é que simplesmente
me faltou o dom para a minha verdadeira vocação:
a de desenhar. 

Porque eu poderia,
sem finalidade nenhuma,
desenhar e pintar um grupo de formigas
andando ou paradas
– e sentir-me inteiramente realizada nesse trabalho.

Ou desenharia linhas e linhas, 
uma cruzando a outra, 
e me sentiria toda concreta nessas linhas 
que os outros talvez chamassem de abstratas”.
A bola de fogo
zanza na impotência
- de muitas cidades.

São paisagens que aliam o abstrato e o figurativo.
Em cores fortes, pinceladas soltas e o descompromisso com a forma, Clarice vai imprimindo sensações como a do Medo, uma tela de maio de 1975 onde predomina o preto e uma massa amarela que, segundo Iannace, é uma boca sem dentes tentando gritar.
Explosão 

Fractal  ativo
turbilhonante fecundo
- a alma de Clarice
Ou Perdida na vaguidão, também daquele mesmo mês, com traços livres em tons terra.
Ave inquieta
nos vôos razantes
- do olhar a terra.
O título Tentativa de ser alegre é um desabafo e uma sugestão. Nesse quadro, Clarice estampa Ulisses, cachorro que a acompanha nos seus últimos anos de vida. O autor registra o depoimento de Clarice em Um sopro de vida:

“Eu quase que já sei como será a minha morte.
A sala vazia, o cachorro a ponto de morrer de saudade. 
Os vitrais de minha casa. 
Tudo vazio e calmo”.
Ela nasceu ciente
da curta temporada
- urge poética.
O vermelho pintado em círculos, manchado com tinta preta. E uma legenda onde há o nome do quadro Raiva e rei[ndifi]ção, de 28 de abril de 1975, como se fosse, na observação de Iannace, uma lápide de sepultura.

Nesse quadro, Clarice sugere uma explosão de movimentos circulares. Iannace cita, nesse mesmo clima lúgubre, Escuridão e luz: centro da vida, com três velas brancas acesas se projetando no meio do negro.

“Não são quadros agradáveis de se olhar"

“As cores são lúgubres
e distribuem-se num feio carregado.
Nem atraem pela combinação de cores
ou pelo ritmo do traçado das linhas. 
Impressiona a carga pesada, funesta.”
Na mão da fada
o feio toca profundo
- brilha Macabéia.
                             Porém, nem tudo é sombra ou avesso.

Farol aceso
na mirabolante obra
  - descobre belezas.
Clarice registra momentos de sonho em Pássaro da liberdade, de junho de 1975, ou Ao amanhecer, de setembro do mesmo ano.

Se comparados aos quadros já descritos, 
exibem motivos ingênuos”.
“Enquanto em um aparece o traçado 
pouco expressivo de uma gaivota azul,
no outro se armam nuvens brancas alvacentas 
ligeiramente azuladas.”

Uma mesma fonte – Para apresentar a escritora e pintora na mesma tela, Ricardo Iannace – como define Aurora Fornoni Bernardini, professora da FFLCH que o orientou na tese de doutorado – traçou uma engenhosa trama entre os textos que Clarice escreveu, traduziu ou leu, onde estão presentes a arte do retrato. O autor tem como referência citações da escritora como:

“Antes de mais nada, pinto pintura. 
Acho que o processo criador de um pintor 
e do escritor são da mesma fonte.

Quando eu escrevo, 
misturo uma tinta a outra e nasce uma nova cor”.
 Corpo e alma
rende-se à exigência
- ora escorre, ora evola.
“O percurso é sabiamente construído”, analisa a professora Aurora.

“Parte de uma crônica de Fundo de gaveta, de A legião estrangeira. Passa pela obra O retrato de Dorian Gray, que Clarice adaptou para o português, e pausa no quadro de Paul Klee, Paysage aux oiseaux jaunes, que Clarice admirou.”

Na análise sobre retrato e fotografia, Iannace vai buscar o estudo de especialistas como Susan Sontag, Roland Barthes e Philippe Dubbois. “Vozes entre outras que acompanham as de Platão e Leibniz no momento da análise profunda de dois escritos fundamentais de Clarice: A imitação da rosa e A quinta história.”

O que é o concreto e o abstrato é o questionamento que Clarice Lispector deixa transparecer entre tintas e textos.

Altiva senhora
brinca de faz-de-conta
o tempo inteiro
O autor termina o livro lembrando o diálogo na crônica intitulada Irmãos:
– Mas agora vamos brincar de outra coisa. Quero saber se o senhor é inteligente. Este quadro é concreto ou abstrato?
– Abstrato.
– Pois o senhor é burro. É concreto: fui eu que pintei, e pintei nele meus sentimentos e meus sentimentos são concretos.

Retratos em Clarice Lispector –
Literatura, pintura e fotografia, de Ricardo Iannace, 
Humanitas e Editora da UFMG, 184 páginas, R$ 36,00.
Uma vida que se conta
Clara Clarice - clareira  fogosa
clareia a gente

Acompanhar as reflexões e inquietações de Clarice Lispector, pesquisar suas histórias e o transcorrer de sua própria vida. Com essa proposta, Nádia Battella Gotlib, professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, vem escrevendo artigos e livros que são uma referência nos estudos sobre a escritora.

Neste mês, a Editora da Universidade de São Paulo (Edusp) lança a sexta edição de Clarice: uma vida que se conta. “Esse livro é o resultado de uma experiência de leitura dos textos de Clarice Lispector que procura considerar sua escrita a partir de uma via dupla”, explica Nádia.

Centra-se nas suas ficções por meio de abordagens críticas; detém-se em certos dados de caráter autobiográfico, desde que tenham eles ligação mais direta com a produção literária, no sentido de que possam contribuir para sua contextualização.”

Nesta edição da Edusp (a anterior foi pela Ática, 
em 1995), Nádia inseriu novos dados e notas.

“Incluí uma cronologia abreviada e esquemática, para facilitar a visualização de informações espalhadas ao longo dos capítulos do livro. E ampliei o repertório de imagens acrescentando fotos e documentos inéditos.”
Clarice: uma vida que se conta, 
de Nádia Battella Gotlib, Edusp, 656 páginas, R$ 62,00.
http://espaber.uspnet.usp.br/jorusp/?p=8340
 Publicado por admin - Segunda-feira, 15 Março 2010
LEILA KIYOMURA
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.